Resumo
As décadas de 1960 e 1970 foram marcadas por um crescimento populacional vertiginoso nas grandes cidades e capitais brasileiras configurando um processo de urbanização rápido e precário à revelia das medidas antecipadas de controle e disciplinamento urbanos implementadas pelo Estado. A partir da criação do SERFHAU, em 1964, pelo governo federal, os métodos de planejamento urbano foram combinados às estratégias de desenvolvimento local que pautavam as políticas traçadas neste âmbito. As medidas de planificação estratégica se intensificaram com a instituição dos PDDIs (Planos Diretores de Desenvolvimento Integrado) e de instrumentos poderosos de gestão territorial, como foi o caso do BNH e dos Planos de Desenvolvimento (PNDs) a partir da PDUR (Política de Desenvolvimento Urbano e Regional), de 1976, elaborado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Urbano (BERNARDINI, 2007: 3). Neste contexto, foram criadas algumas estratégias de planejamento local que tinham como objetivo melhorar qualitativamente as condições de serviços de infraestrutura das cidades e corrigir distorções causadas pela especulação imobiliária (ANDRADE e AZEVEDO, 1982: 82).
O Projeto CURA (Comunidade Urbana para Recuperação Acelerada), criado em 1972 e financiado com recursos do BNH, cujas bases conceituais foram desenvolvidas pelo arquiteto carioca Harry James Cole, partia da escala do bairro para a implantação de redes de infraestrutura, equipamentos públicos e comunitários como forma de difundir tais melhorias à escala municipal e regional. O principal objetivo desta pesquisa é investigar os pressupostos e o conteúdo do Plano Itaquera-Vila Matilde, no âmbito do Projeto CURA, concebido e realizado pelo escritório do arquiteto Harry Cole, sob condução da antiga EMURB (Empresa Municipal de Urbanização) da Prefeitura de São Paulo. Partindo de referências conceituais do plano elaborado para a Vila Valqueire, no Rio de Janeiro, este plano possui elementos importantes para revelar a introdução da escala do bairro nos processos de planejamento em expansão no período, considerando, principalmente as ideias urbanísticas relativas à concepção original traçado por COLE.
A associação entre projetos de habitação e transporte se estabeleceu, mas com um
resultado problemático, materializado no desequilíbrio da distribuição de emprego e moradia
e no movimento pendular que sobrecarrega o metrô desde o princípio de sua implantação.
Depois da chegada do metrô a Itaquera, investimentos públicos e privados
contribuíram para o desenvolvimento da região. Todavia, os investimentos ainda se
encontram em um nível inferior ao necessário para equilibrar a distribuição de emprego e
moradia.
Em 1969, o PUB já propunha enfaticamente a implantação de mais de uma linha de
metrô na Zona Leste. Dada a demanda na região, tal proposta foi corroborada por estudos
produzidos pela própria Companhia do Metropolitano na década de 1970. Essa
recomendação expressa há mais de 40 anos torna secundária uma eventual discussão
sobre a escolha do traçado da linha Leste-Oeste. Seria mais pertinente questionar por que
somente uma linha de metrô foi construída na Zona Leste até o começo do século XXI.
CONCLUSÕES
A transformação de Itaquera no último quartel do século XX representa o exemplo
mais expressivo da associação de transportes de massa com habitação social em São
Paulo.
Entendemos, como Damiani (1993), que a ação coordenada entre COHAB e Metrô
ajudou a dar forma e a consolidar uma parte da periferia da cidade. Essa intervenção
associada no território carrega influências das discussões em torno do urbanismo realizadas
dentro e fora do país, sobretudo no período pós-Segunda Guerra Mundial.
Um caso tão raro não se produz em função de um só fator. Entre os fatores mais
decisivos, estão o crescente apoio à implantação do metrô em São Paulo e a emergência do
problema habitacional no país e na capital paulista entre as décadas de 1950 e 1970,
consequências diretas do forte crescimento populacional que a metrópole de São Paulo
apresentou no período; a condição de Itaquera, servido pela centenária ferrovia e com
terrenos vagos; e o fato de a Companhia do Metropolitano ter permanecido por pouco mais
de dez anos sob o controle da administração municipal.
As iniciativas do Metrô e da COHAB coincidiram com propostas do PUB para
Itaquera. Embora a influência do plano concluído e engavetado em 1969 sobre as ações
dessas empresas possa não ter sido absoluta, a sobrevivência de suas propostas no âmbito
da administração municipal, ao longo da década de 1970, é evidente nos documentos
produzidos pelos planejadores do Metrô e da Prefeitura. Essa comprovação da permanência
das propostas vai ao encontro da observação de Feldman a respeito do caráter dos grandes
planos da época como formadores de “quadros técnicos para o planejamento urbano” (2005,
p. 216).
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